O Guardião

"Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam."
Clarice Lispector

Ele olhava para o rosto pálido e abatido de Pamila. Sabia o que a oprimia, conhecia os seus conflitos, os seus dilemas, as suas angústias, os seus questionamentos. Conhecia toda a sua história. Como? Embora ela não soubesse, ele vinha acompanhando-a desde o momento em que fora concebida.

Acompanhara seu nascimento, sua infância, sua adolescência, o início de sua vida adulta. Embora Pam não o enxergasse, estivera ao lado de sua cama nos dias em que ela caira doente. Embora ela não o sentisse, abraçara-a nos momentos em que ela se sentia sozinha ou com medo. Pam não podia ouví-lo, mas ele sempre falara palavras sábias e reconfortantes em seus ouvidos, sempre orientou-a. Algumas vezes ela conseguira sentir ou assimilar algo que lhe era dito, mas não através de seus cinco sentidos e sim através do que ela chamava de intuição.

Esta noite não fora diferente. Pam estivera em mais uma das suas crises e ele ficara ao seu lado todo o tempo. Falara-lhe, pela enésima vez, sobre o seu destino, sobre sua missão de vida, sobre o que Pam estava destinada a fazer. Ela não ouvia suas palavras, mas sentia cada vez mais uma sensação reconfortante. Sentia dentro de si uma certeza - que não sabia de onde vinha - de que não devia desistir ainda. Que havia algo reservado para ela. Sim, ela de alguma forma sabia disso, mas não imaginava que recebia estas coisas através daquele ser ao seu lado. Como poderia saber?

Pam sempre ouvira que existiam anjos, mas nunca teve certeza disso. De qualquer maneira, histórias e desenhos de anjos tinham um efeito muito forte sobre ela. Mal sabia que havia - e sempre houvera - um ao seu lado...

Conforme a sensação de confiança, de calma, de acolhimento expandia-se, Pam relaxava, até o momento em que entregou-se ao sono e ao cansaço. Ele, por sua vez, sabia que no dia seguinte ela já estaria melhor. Conhecia sua protegida, olhara sua alma diversas vezes. Sabia, melhor do que qualquer outra pessoa, a força que estava guardada naquele ser. Sabia que algo dentro de Pam era muito mais forte do que a escuridão que às vezes caia sobre ela e isto era o que importava, pois isso a manteria no caminho certo e a faria cumprir o seu destino. Sabia também que sempre estaria ali, ao lado de sua "amada criança" - era assim que via sua protegida - acolhendo-a, incentivando-a, inspirando-a, cobrindo-a de amor e de luz, preparando-a para a sua jornada em busca de si mesma.

0 Olhares na Caixa:

Blogger Templates by Blog Forum